terça-feira, 27 de julho de 2010

SOBREVIVENDO NO CAOS

22/07/2010 11:04:54
Thomaz Wood Jr.

Grandes corporações continuam a projetar uma imagem positiva de competência, realização e poder. Por dentro, no entanto, a luta contra o caos é cada vez mais árdua
O brilho dos famosos logotipos costuma ter efeito hipnótico sobre jovens recrutas. O jogo de sedução começa cedo. Grandes empresas procuram atrair os cérebros mais ágeis e os braços mais dispostos aos seus exércitos. O flerte inclui estratégias de abordagem direta, com palestras e feiras de recrutamento realizadas nas faculdades, incubadoras de corações e mentes para uso industrial.
Moços e moças, inebriados pelas promessas de futuro risonho, submetem-se a duras provas pelo direito de vender a alma – e os fins de semana – para as grandes corporações. Alienam-se por bons salários e atraentes benefícios. Além do soldo, esperam aprender uma profissão: depois de quatro ou cinco anos expostos a docentes desinteressados e conhecimentos desatualizados, acreditam que seus novos senhores lhes ensinarão algo de útil. Afinal, as grandes corporações supostamente dominam o estado da arte da tecnologia e da gestão. Tradição e porte, sugere tal raciocínio, fazem dessas organizações invejáveis depositários das mais modernas práticas administrativas.
Certo é que esses gigantes corporativos continuam a projetar uma imagem de competência, realização e poder. Vultosas verbas promocionais fazem milagres pela reputação. Com uma boa estratégia de comunicação, não é muito difícil fazer um brutamontes poluidor passar como exemplo de respeito ao meio ambiente. Da mesma forma, é possível mostrar mofadas burocracias e sulfurosas neoburocracias como organizações descontraídas e criativas.
Infelizmente, nem tudo o que as campanhas publicitárias sugerem é verdade e, para os jovens recrutas, o início da vida profissional em grandes corporações pode se tornar uma grande decepção. De fato, muitas grandes corporações parecem viver mergulhadas em um daqueles tanques de areia movediça dos velhos filmes de Tarzan: lutam para manter o nariz à tona, mas quanto mais se debatem, mais afundam. Seus profissionais atuam como bombeiros, a apagar incêndios que irrompem por todo lado. Encerram exaustos suas longas jornadas, contentes por mais um dia de sobrevida, mas sabendo que no dia seguinte outros incêndios virão.
Qual a origem desse caos? As exuberantes décadas da globalização fizeram aflorar moléstias diversas, que seguem pandêmicas, sem antídoto à vista. A primeira causa do caos foi o movimento frenético de mudanças pelo qual as empresas passaram, algumas necessárias, outras nem tanto. Com ingenuidade calculada, elas foram incorporando novidades gerenciais de procedência duvidosa e efeito calamitoso. O resultado foi um acúmulo de processos, normas e sistemas de benefício incerto, a roubar tempo precioso dos executivos.
A segunda causa do caos foi a febre de fusões e aquisições, a colocar debaixo do mesmo teto empresas com histórias particulares, sistemas distintos e estilos diferentes de gestão. Pressionados a gerar resultados cada vez mais ambiciosos, esses aglomerados disformes transformaram-se em gigantescas panelas de pressão, com seus habitantes desnorteados, procurando manter as aparências enquanto saltam de reunião em reunião, sem rumo ou direção.
A terceira causa do caos vem de longe, tendo sido exacerbada pelas duas causas anteriores. Trata-se da notória incapacidade dos executivos locais para planejar, ou seja, a dificuldade crônica de parar e pensar no que deve ser feito, antes de começar a fazer. Essa atração libidinosa para a ação irrefletida transforma a vida profissional em uma verdadeira montanha-russa, com altos e baixos, e muitas emoções, mas sempre voltando ao mesmo ponto.
Há alguns anos, uma grande empresa de consultoria lançou uma interessante campanha publicitária em revistas de negócios. Em cada inserção, uma foto de impacto. Em uma das fotos, uma sala de reuniões surge de ponta-cabeça, os móveis presos no teto, enquanto os executivos, atônitos, se agarram às bordas da mesa, esforçando-se para não despencar. Em uma segunda foto, as divisórias das baias são substituídas por espelhos, para criar um ambiente sem referência espacial. Executivos bem-vestidos esgueiram-se sem rumo, confusos e preocupados. Em uma terceira foto, um moderno escritório transforma-se em aquário: móveis, equipamentos e papéis flutuam, enquanto executivos lutam para se equilibrar e trabalhar.
A campanha pretendia mostrar situações que os bons serviços da consultoria poderiam evitar. Inadvertidamente, retratou a insólita realidade das grandes corporações e seus atarantados habitantes. A perdurar tal contexto, em pouco tempo não teremos mais executivos, mas apenas hordas viciadas em emergências imaginárias, incapazes de deixar as salas de espelhos e os aquários, vivendo em um mundo invertido, como se natural fosse.

Retirado da Coluna Gestão, de Thomaz Wood Jr, na revista Carta Capital.

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